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As boas intenções não justificam nada

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    redepsicoterapias
  • 24 de mar. de 2014
  • 3 min de leitura

Dizem por aí que ninguém erra de propósito. Não é bem assim. Todos nós possuímos um sistema moral de valores. Desse sistema, extraímos as razões que, em nossa opinião, nos parecem boas o suficiente para justificar nossas ações. Entretanto, algumas vezes agimos motivados por razões que, aos nossos próprios olhos, não se justificam pelo sistema de valores que adotamos; são razões que contrariam nossos princípios mais importantes, e que temos vergonha de confessar aos outros. Nessas ocasiões, quando nos pedem o porquê de termos agido assim ou assado, somos obrigados a inventar uma desculpa que dificilmente deixa de mostrar sua artificialidade.


No entanto, muitas vezes também acontece de agirmos motivados pela certeza de estarmos fazendo a coisa certa. Essas ações encontram a justificativa mais forte em nosso sistema moral de valores. Quando nos pedem o porquê de termos agido assim ou assado, respondemos com segurança e facilmente passamos a convicção de estarmos sendo verdadeiros na resposta. Não temos dúvida de ter agido com a melhor das intenções.


A confiança em nossas boas intenções se fundamenta no sistema de valores que adotamos, ou seja, nas nossas crenças sobre o que é certo ou errado, bom ou ruim. Infelizmente, a maioria dessas crenças se fundamenta em alguma forma de autoridade. Tomamos a autoridade da tradição, de nossa criação ou de alguma religião para justificar nossos valores morais e, consequentemente, nossas ações. Quando justificamos nossos valores na autoridade, inconscientemente ou não estamos nos rendendo à crença de que nossa noção do que é certo ou errado, bom ou ruim faz parte da natureza das coisas. É como se a “natureza das coisas” que nos dissesse como elas são ou devem ser. É bastante comum, inclusive, utilizarmos essa premissa como o argumento basilar de nossa justificativa. Quem, numa conversa, nunca disse ou ouviu alguém dizer, na defesa de uma atitude sua ou alheia, frases do tipo: “É assim que as coisas são”, “É assim que as coisas devem ser”, “Foi assim que Deus fez as coisas”, “Fomos feitos para isso”, “Não fomos feito para aquilo”, etc.?


A crença de que nossos valores se fundamentam na natureza das coisas traz implícitas duas outras crenças bastante problemáticas: (1) A de que conhecemos plenamente a forma como as coisas são e a de que (2) não é necessário discutir esses valores, uma vez que eles se fundamentam nos fatos e, como diz a “sabedoria” popular, “contra fatos não há argumentos”. Consequentemente, quando usamos nossas boas intenções como justificativa para o que fazemos, corremos sério risco de nos tornarmos autoritários e resistentes às opiniões divergentes das nossas.


Se o certo, o errado, o bom e o ruim se fundamentam ou não na natureza das coisas, não podemos saber. Só podemos ter a certeza de não possuirmos o conhecimento pleno de como as coisas são ou deixam de ser. Consequentemente, não deveríamos perder a noção de que nossos valores são sempre relativos, provisórios e insuficientes. Não deveríamos perder isso de vista principalmente quando está em questão o que é bom ou ruim para outras pessoas. Se muitas vezes não sabemos nem o que é o melhor para nós mesmos, o que dizer então do que achamos ser o melhor para os outros? Não há problema algum em termos nossa opinião sobre o que é melhor para as pessoas. Mas, toda opinião deve estar sujeita à discussão e à revisão, e quando justificamos uma atitude nas nossas boas intenções e no desejo de fazer o melhor aos outros, ao invés de discutir nossa opinião sobre esse melhor e as conseqüências reais do que fizemos, estamos subrepticiamente tentando nos esquivar desse debate e encerrar a discussão. É como se disséssemos: ‘As conseqüências do que fiz para você são menos relevantes do que as boas intenções em que minha ação se fundamentou. Pois, minhas intenções se justificam na forma como as coisas são ou deveriam ser, por isso minha ação está correta por princípio, ainda que suas conseqüências tenham sido desastrosas. Portanto, é irrelevante discutir essas conseqüências e desnecessário me desculpar por elas. A simples constatação das minhas boas intenções deve servir de argumento suficiente para encerrar a discussão a meu favor.’


As boas intenções se revelam plenamente na disposição de compreender as conseqüências negativas que nossas ações exercem nas pessoas e de rever nossas crenças sobre o que é certo ou errado, bom ou ruim. Consequentemente, elas se revelam na disposição de debater abertamente essas questões com os envolvidos e de jamais usar a si mesmas como justificativa para o que fizemos. As boas intenções sabem que elas não servem de justificativa para nada.



*Daniel GrandinettiÉ psicólogo de influência existencial e psicanalítica. Atua na clínica há 12 anos. Tem a graduação e o mestrado em Filosofia e atualmente é doutorando, também em Filosofia, pela UFMG. É ensaísta e publica seus textos na página 'Psicologia no Cotidiano' do Facebook: www.facebook.com/cotidianoepsicologia.

 
 
 

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