Sobre encontros e finais
- redepsicoterapias
- 9 de jul. de 2014
- 3 min de leitura
Passa-se o tempo e chega uma hora em que as coisas acabam. Não me lembro em que momento da faculdade deparei-me com a fala de que toda relação tem um fim, mesmo que esse seja a morte. Isso colocou-me a pensar em todos os encontros, sejam eles amorosos, de amizade ou profissionais, como com um tempo marcado para acabar, mesmo que seja com a morte de uma das partes. Encontros podem durar muitos anos ou ser breves, mas o incontestável é que todos acabam.
Tudo bem, isso não é bem uma novidade e não é também tão simples. Os fins podem vir de muitos jeitos, e por vezes descompassados, como no caso de um relacionamento amoroso no qual uma das partes decide antes da outra que o fim chegou. “Não é você, sou eu” pode ser a forma mais banal, e também a mais sincera, de anunciar um final.
Porque as pessoas mudam. Os gostos mudam. Os amores se transformam, de um dia para o outro, por mais difícil que seja aceitar isso, quando você é o lado mais fraco da história. A “eterna novidade do mundo” está nos pressionando diariamente com um chamado para evoluir e crescer, e isso, muitas vezes, significa abandonar pensamentos, hábitos, lugares e também pessoas.
O problema não é você, somos todos nós. Todos que estamos de algum modo abertos a crescer com as vivências - boas ou má -, que, de algum modo, nos impulsionam pra frente. Se formos atentos, poderemos perceber o quanto saímos diferentes a cada tropeço ou acerto, e o quanto pensar sobre isso pode trazer compreensões novas sobre a gente mesmo. Cada dia que amanhece nos coloca um novo questionamento: como serei hoje?
Às vezes não percebemos bem o quanto estamos mudando, ou mesmo ficamos com medo das mudanças. Mais difícil é entender que algumas pessoas, mesmo aquelas que a gente ainda ama muito, não servem mais para o novo “a gente mesmo” que nos tornamos. Os poetas cantam desde o início dos tempos a necessidade de aproveitar a eternidade do hoje, e não sem motivo. Que amanhã é esse do qual queremos tanto nos certificar, sendo que nem ao menos sabemos quem seremos até lá?
Permitir um fim, deixar acabar, é um treino. Exige uma abertura a rever-se, abrir-se e desafiar-se a estar sozinho. Ou de propor-se a abertura de um novo outro – o que dá um tremendo trabalho, visto que o outro é sempre uma encrenca. Isso exige também uma disposição à responsabilidade, caso tal novo encontro também fracasse, o que é possível.
Mas pense nas conversas que são privadas, quando nos mantemos em uma relação em que não temos mais troca. Quando ouvimos as conversas com metade do ouvido, porque não achamos mais interessantes. Ou quando estamos presentes em corpo, mas a mente voa longe. Em quantas chances damos ao outro, sem dar uma chance a nós mesmos.
E agora expanda o pensamento para o tanto de gente que existe no mundo. No encanto presente nos lugares ainda não vistos, nas histórias desconhecidas, nas lutas diárias que ainda não foram narradas pela arte: tudo isso está ao alcance de qualquer um que se permita dizer “bom dia” a um desconhecido. Este está sendo o meu treino diário. Até breve!
*Sabrina Lima é estudante de psicologia pela PUC-SP, é colunista da Rede Psicoterapias, onde escreve às quartas-feiras sobre cotidiano e contextos de crise em clínica ampliada. Além da Psicologia, é amante de música e das palavras, e atualmente se dedica ao estudo da escrita e suas formas de expressão como recurso terapêutico.
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