Autenticidade e a Teatralização da Vida (Ser quem não é, falar o que não pensa e agir como não quer)
- redepsicoterapias
- 10 de jul. de 2014
- 5 min de leitura
Ainda pequenina, desde que me entendo por gente, sempre gostei de ficar observando as pessoas conversando e se relacionando. Encantavam-me e prendiam-me como um imã essas situações (rs). A maneira como as pessoas falavam, se comportavam, se colocavam, riam, xingavam... tudo me era muito instigante! Muitas vezes eu ficava no parque simplesmente admirando, introjetando e fantasiando a respeito das relações interpessoais. Era interessantíssimo!
Cresci e, juntamente comigo, cresceu o interesse em entender melhor como se dão as relações humanas. Percebi, ao longo das minhas inúmeras observações e constatações, que as pessoas, de uma forma geral, têm muita dificuldade em serem autênticas. Sim, a maioria das pessoas não conseguem se colocar de forma verdadeira nas relações sociais. Muitas não conseguem dizer não, mudam seus planos para agradar os outros e algumas até se prejudicam severamente, para simplesmente fazerem aquilo que o outro esperou que elas fizessem. Elas não conseguem falar o que pensam, agir como realmente desejam e pensar da forma como gostariam, porque sabem que, procedendo dessa forma, elas fogem do script social e sofrerão sansões.
Fato é que, no decorrer da vida, com várias experiências de prazer e desprazer social, você percebe que se você não fala, age e até "pensa" como as outras pessoas desejam, você certamente terá problemas. Penso que o principal problema enfrentado por pessoas que decidem ser, agir e falar de forma autêntica e sem máscaras, é a rejeição, que culmina (infelizmente), num certo isolamento social. Hoje em dia, o que se vende é a imagem. É um jogo de politicagem sem fim. Nas conversas sociais, é uma risadinha aqui, um abraço ali. Todos falando a mesma língua, lutando pela mesma causa. Exteriorizando uma coisa que, muitas vezes, não sentem ou pensam, apenas para agradar os outros. E ai se houver um opositor! É banido do grupo imediatamente. Ou não. Muitas vezes ele começa a ser deixado de lado, de forma gradual e progressiva. Sem falar das situações onde há um líder no grupo. Ai daquele que demonstrar qualquer oposição às normas estabelecidas por ele! Será banido e ignorado. Agora me diga, quem quer passar por isso e se sentir desprezado?! Ninguém! E aí o jogo é alimetado e retroalimentado. Muitos optam por fazer o jogo e assim; continuam sendo "aceitos" pelo grupo. Mas será que ele está sendo realmente aceito, ou o que está sendo aceito é seu comportamento e conduta dentro do esperado?! Entendem?!
Há poucos dias atrás, aconteceu algo semelhante ao que descrevi acima. O líder de um grupo determinou uma mudança, sem sequer consultar ou propor uma votação (democracia) aos integrantes do grupo. Uma atitude (no meu ponto de vista) totalmente arbitrária! Agora me pergunta como reagiu o grupo?! Ninguém ousou dizer nada!! Por que?! Por puro medo!! Pois sabe que se ousar-se posicionar, conversar e propor uma reflexão ao grupo (em relação a atitude arbitrária do líder), isso poderá (e certamente irá) culminar na sua rejeição e afastamento dos demais colegas de grupo (que certamente não querem correr o risco de entrar num embate com o dirigente). Pecebe quão triste isso é?! Isso acontece todos os dias, em todos os lugares. Vamos sendo o que não somos, fazendo o que não gostamos e falando o que não queremos e nem acreditamos, simplesmente para sermos aceitos e agradarmos a um determinado grupo de pessoas.
Não sei você, mas eu conheço dezenas de pessoas que, em cada cena que vivem, usam uma máscara diferente. É aquela velha frase: "Vamos dançar conforme a música!". Não estou dizendo aqui que você deve propagar aos quatro cantos da terra o que você pensa, sente, acredita. Também gostaria que você entendesse que ser autêntico não significa ser grosseiro ou achar que a sua verdade, seu jeito e sua forma de pensar e viver são o modelo à ser seguido. Há sim situações em que o silêncio é a melhor resposta e onde nem sempre palpitar sobre tudo é o melhor caminho. Porém, há também aqueles momentos em que se omitir não é a melhor opção. A reflexão que eu gostaria de propor é sobre essa teatralização da vida! Como disse anteriormente, vende-se imagem!. Devemos nos preocupar com nossa imagem sim, mas até que ponto temos que criar e recriar imagens e personagens, ao longo do dia, para sermos aceitos?! Isso gera um desgaste emocional, psíquico e físico, sem precedentes!
Esse é um assunto que me causa muito e é difícil não me prolongar (rs). Mas, para finalizar, quero apenas frisar que, quando você escolhe ser, falar, pensar e agir de forma autêntica, haverá consequências e repostas importantes da sociedade. Por experiência própria, muitos ficarão um tanto quanto chocados com você. Acharão meio estranho, afinal, como pode alguém se posicionar sem medo de represálias?! Eles ainda não entendem que o medo existe, mas que ele é ínfimo se comparado ao vulcão genuíno de ideias e valores que existe dentro de você. Outra coisa: você será odiado ou amado! (rs). Não tem como fugir disso! Mas, o mais importante de tudo e o que mais me motiva a seguir sendo quem simplesmente sou, é que no final das contas, sou aceito ou repudiado exatamente por aquilo que verdadeiramente sou. Quando me amam ou me odeiam, serão a mim, e não a um personagem, que designarão tais sentimentos. É preciso entender também que conseguir ser autêntico não é algo que acontece de um dia para o outro, porque esse comportamento está ligado à história do indivíduo. Foi adquirido ao longo do tempo. É muito simplista, por exemplo, querer que uma pessoa que tem dificuldades em dizer não, consiga se posicionar autenticamente de um dia para o outro. Não! Essa pessoa, especificamente, precisará rever sua história, reavaliar a maneira como se vê (trabalhar autoestima e autoimagem), pois só a partir daí, ela conseguirá fazer progressos importantes no seu comportamento. (Trata-se sempre a causa, e não apenas os sintomas, de forma isolada). Ser autêntico é uma experiência transformadora e enriquecedora! Gera maturidade, crescimento e suporte para enfrentarmos os problemas na jornada das nossas vidas, pois, de alguma forma, a autenticidade nos fortalece! De uma forma incrível, ela nos revigora e nos faz acreditar mais em nós mesmos. É algo estarrecedor!! Que tal fazer um teste?! Vamos juntos?! =)
*Flávia Rates - Psicóloga Clínica, tem como abordagem teórica a Psicanálise. Trabalha com famílias, casais, crianças, psicoterapia em grupo e individual. Atua de forma especial com as mulheres no período de gestação, parto e puerpério, dando suporte emocional e psíquico nesse importante momento da vida. É idealizadora e fundadora do "Super Mães", um grupo que tem como objetivo trazer informações, pesquisas e muita emoção relacionado ao universo infantil e a todo âmbito familiar. Escreve às sextas, como colunista na Rede Psicoterapias, sobre família, maternidade, pais e filhos, e reflexões acerca da existência.
Site: www.flaviarates.com.br
Email: flaviarates@gmail.com
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