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As ilusões do otimismo e as lições do futebol

  • Foto do escritor: redepsicoterapias
    redepsicoterapias
  • 28 de jul. de 2014
  • 4 min de leitura

Realista é quem sabe analisar as possibilidades presentes para concluir se o futuro é favorável, desfavorável ou incerto. A avaliação favorável não é necessariamente otimista. A conclusão de que o futuro é favorável será fruto da postura realista desde que a avaliação seja imparcial. Otimista é a avaliação que intencionalmente diminui a importância das possibilidades desfavoráveis para privilegiar as favoráveis. No entanto, não há base lógica que sustente essa falsificação. É por isso que o fundamento do otimismo não é a razão ou a análise, mas o entusiasmo. Enquanto o espírito realista é sereno, sejam suas previsões favoráveis ou desfavoráveis, o otimista é entusiasmado, sejam as possibilidades à sua frente favoráveis ou extremamente desfavoráveis! Otimista é quem crê incondicionalmente que tudo dará certo.


O otimismo se assemelha ao pensamento mágico. Somos possuídos pelo espírito otimista ao acreditarmos que tudo dará certo mesmo quando a análise imparcial das possibilidades nos força a crer no contrário. Por isso, o otimista geralmente não sabe como as coisas darão certo, ele apenas acredita que tudo dará certo... como num passe de mágica. Se o otimista não sabe como as coisas darão certo, obviamente também não sabe o que ele precisa fazer para que elas possam dar certo. Consequentemente, a atitude de muitos otimistas é passiva; eles esperam que as coisas dêem certo. E já que não podem justificar seu otimismo nem na análise imparcial dos fatos e nem na confiança depositada em suas próprias ações, o otimista geralmente nutre algum tipo de crença mística, religiosa ou supersticiosa: ele acredita que a vida distribui seus bens de acordo com o merecimento, e que sua generosidade, caridade, educação e ética são razões suficientes para que coisas boas lhe aconteçam; ele acredita que o sofrimento acumulado também conta como merecimento para ganhos futuros; acredita que a vida guarda seus bens para nos dar no momento certo, e que se o momento não foi antes, agora, ou depois, será em breve... ou mais para a frente... ou um pouco mais, talvez. Acredita que o esforço, mesmo mal empregado e direcionado, também o faz merecedor de coisas boas; acredita que o fato de os outros terem mais que ele o faz merecedor de ter pelo menos um pouco; ele acredita, enfim, que as coisas acontecem magicamente “do jeito que tem que ser”.


O otimismo é bastante valorizado em nossa cultura. Aprendemos desde cedo a ver o lado bom das coisas ruins. No entanto, se ver o lado bom das coisas ruins é uma virtude, aceitar seu lado ruim sem travesti-lo de bom também é, e essa é uma virtude que o otimista geralmente confunde com o pessimismo. O otimista costuma confundir a busca pelo lado bom nas coisas ruins com a negação do lado ruim das coisas. E quando o lado ruim das coisas prevalece sem dar chance para travesti-lo novamente de bom, o choque com o duro chão da realidade derruba o otimista no abismo da depressão. Por isso, não é raro encontrar entre as pessoas mais otimistas muitas que costumam apresentar tendências depressivas acentuadas, pois o otimista não suporta o lado negativo da vida, e quando não temos alternativa senão encará-lo, ele prefere nele mergulhar de cabeça para ver se, ao atingir o fundo do poço, consegue ressurgir renovado em seu otimismo. É preciso ser muito otimista para acreditar nisso!


Recentemente, toda a nação brasileira foi vítima do otimismo. Mesmo diante de uma Seleção de futebol fraca, acreditamos no discurso otimista de nosso treinador, que dizia a todo instante estarmos com as mãos na taça. E mesmo sem saber exatamente como iríamos chegar ao triunfo, acreditamos que a mística da nossa camisa e a força da torcida seriam razões para a vitória; acreditamos que o fato de jogarmos em casa e de nosso povo ser sofrido nos tornaria merecedores da vitória. Acreditamos, enfim, que a hora era agora, e a copa seria nossa, de uma forma ou outra. Então, a realidade mostrou seu lado mais negativo, sem nos dar chance de travesti-lo novamente de bom. Mergulhamos na perplexidade e na tristeza, mas crentes de que, tendo atingido o fundo do poço, o único caminho à nossa frente será o do ressurgimento, na próxima copa, de toda a glória do passado.


O otimista realmente acredita que, depois do fundo do poço, necessariamente virá a redenção, a salvação, a retomada do caminho na direção da luz, pois, o otimista acredita que o fundo do poço exista! Ele acredita no fundo do poço e em seu efeito revitalizante mágico. Somente o realista sabe que o poço é sem fundo, e que é possível descer sempre mais, se não tomarmos cuidado. Por isso o otimista chama o realista de pessimista. Mas, saber que o poço não tem fundo e que é possível descer sempre mais é diferente de acreditar incondicionalmente que só nos resta a descida sem fim. O realista sabe que não existe limite para o tanto que as coisas podem piorar, e por isso também sabe que não há limite para o tanto que elas podem melhorar. Mas, ao contrário do otimista e do pessimista, ele não acredita incondicionalmente nem na melhora e nem na piora.


É verdade que o otimismo pode ajudar a vencer. Se a atitude otimista encontra condições favoráveis, ele pode nos levar à vitória, mesmo que não tenhamos nos preparado devidamente para conquistá-la. Quantos jogos, lutas e batalhas já não vencemos assim? É a chamada sorte de campeão! No entanto, quando entramos no jogo da vida sem preparo e munidos apenas do entusiasmo mais otimista, as derrotas podem ser traumáticas. Nada dói mais que uma ilusão perdida, e o otimista vive de ilusões, ainda que, vez ou outra, ele se saia bem sucedido, mesmo sem saber como. Isso vale para o futebol, e para a vida também.


*É psicólogo de influência existencial e psicanalítica. Atua na clínica há 12 anos. Tem a graduação e o mestrado em Filosofia e atualmente é doutorando, também em Filosofia, pela UFMG. É ensaísta e publica seus textos na página 'Psicologia no Cotidiano' do Facebook: www.facebook.com/cotidianoepsicologia.

Daniel Grandinetti – Psicólogo da Rede Psicoterapias

 
 
 

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