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"Ser ou não ser, eis a questão!"

  • Foto do escritor: redepsicoterapias
    redepsicoterapias
  • 8 de ago. de 2014
  • 4 min de leitura

Abro meu Facebook certa manhã e deparo-me com a frase, de autoria desconhecida, "Que pena que os homens não podem trocar seus problemas... Todo mundo sabe exatamente como resolver o problema dos outros".


Por trás da visível ironia, há uma verdade nem sempre visível. Escrevi eu, em meu humilde minifúndio virtual (minha página no Facebook), ao compartilhar a referida frase: "Eis a fantástica diferença entre palpite e terapia: na segunda, o cliente é levado a compreender-se, compreender o que o aflige e adquirir gradativamente a segurança para superar (ou lidar) com o que o preocupa."


Ser o outro e estar no lugar do outro são coisas nem sempre vistas como diferentes. De um terapeuta, espera-se a empatia necessária para "estar" no lugar do outro. Ou seja: perceber, não banalizar, não minimizar a queixa do paciente. Mas ser o outro, espera-se também que o terapeuta tenha sanidade suficiente para não buscar fazê-lo.


Não raro, nós, terapeutas ou analistas, deparamo-nos com angústias, depressões ou meras insatisfações traduzidas por querer-se ser quem não se é. E não pense você que esse "quem não se é" limita-se ao mundo dos famosos, não: há o querer ser como a irmã, a cunhada, o amigo, o pai, a mãe e até o pardal da praça ("Ah, eu queria ser um pardal, para voar livre, comer a hora que quiser, dormir a hora que quiser, não viver aprisionado" - sim, pardais não se criam em gaiolas - "não chamar a atenção de ninguém..."


Eu sempre me lembro de um livrinho cuja sabedoria é inversamente proporcional ao tamanho (existe edição de bolso menor do que um maço de cigarros), intitulado "A Imitação de Cristo", cuja autoria é creditada, em meio a muitos mistérios, é creditada ao religioso alemão Thomas de Kempis.


A proposta do autor não é que o leitor passe pelos mesmos sofrimentos de Cristo, culminando com traição, paixão e morte na cruz: imitação, no caso, é meditar sobre os ensinamentos e aplicá-los à própria vida, sem fórmula mágica, sem que a obra seja um texto de autoajuda: é uma reflexão, que pede ao leitor escolher um horário preferencialmente fixo para lá estar imerso à leitura. Horário fixo, lá estar, imergir, relatar, lembra-me algo que não me é estranho! Ah, já sei: terapia.


A palavra "imitar", com o avanço crescente da tecnologia, o que inclui cópias heliográficas (xerox), a Ctrl C Ctrl V, compartilhamentos, encaminhamentos, ganhou certa conotação de cópia: ser uma cópia fiel de algo. Como, no campo da genética, a clonagem da ovelha Dolly e outras clonagens tantas.


Mas será que imitar é ser igual, ou espelhar-se, inspirar-se, seguir o exemplo?


Há um ditado, dos mais sábios, que diz: "Os bons devem ser imitados; os maus, evitados".


Mas o que imitamos? Gisele Bundchen é uma grande modelo porque é magra. Emagrece-se e voilà: torna-se Gisele Bundchen! Roberto Carlos é o "Rei" porque veste-se de azul? (Tudo bem que música de priscas eras dizia "Vesti azul/Minha sorte então mudou? Pa-pa-pa, pa-pá!"; mas eu, inoceeeeeeeeeeeente, achando que mantos de reis eram vermelhos, tal e qual carne da Friboi?). Vesti azul e tenho "um milhão de amigos" (no Facebook ou na vida real)? Alguém "devia jogar basquete", porque é alto? Mesmo se o cara odeie esporte (o que não é saudável e difere de não ser muito chegado a praticar) e prefere ler Guimarães Rosa e Machado de Assis?


O que me leva a perguntar: Qual a altura e o peso de um professor? De um médico? De um cientista? De um psicólogo? Certa feita, para se tirar uma foto para uma peça publicitária, os alunos encarregados da tarefa convocaram-me (sou muito fotogênico, Deus está vendo!) e a "assistente de produção" me disse: "Coloca esse óculos, para ficar parecendo professor!" ?????????????????? Hein? E aqueles anos todos de estudos, aquele debruçar-se sobre matérias nem sempre as mais queridas, o perder boas horas de bons filmes, boa música e boa companhia? Bastava colocar óculos? Putz! Traumatizei; vou procurar um terapeuta! Ops! Não vai dar: ele acabou de descobrir que não precisava ter estudado Psicanálise: bastava deixar o cavanhaque crescer, comprar um divã, assentar-se à cabeceira do mesmo e anotar tudo num bloquinho.


"Ser ou não ser, eis a questão!", frase clássica do drama shakespeareano "Hamlet" (foto que ilustra o artigo) é a grande questão. E o que poucas pessoas não percebem é que dá para se ser quem é, imitando os bons. Mas... acrescentando aquela pitadinha própria e única, que cada um de nós tem. Os Beatles, por exemplo, no início de carreira, queriam ser maiores do que Elvis. E aí vai outro grande ensinamento que uma série de injunções não permitem várias vezes que se coloque em prática: um bom mestre (biblicamente, não se chama a ninguém de mestre) é o que tudo faz para que seu discípulo seja maior do que ele. É o técnico que ensinou os primeiros fundamentos a Pelé, Neymar Jr., Messi, Cristiano Ronaldo, Robben, ou aos jogadores do selecionado alemão e do América (atenho-me a citar como exemplos só os grandes, daí o América), é o(a) professor(a) que apostou naquele menininho de nome Arthur Moreira Lima, João Carlos Martins e outros, que foram em busca das primeiras aulas de piano; é quem ensinou técnica vocal a Pavarotti, Plácido Domingo e Carreras... e por aí vai. Certamente, disseram a eles: "Observe e busque fazer como eu!" Mas não disseram: "Seja eu!"


Mas isso é muita água a passar por debaixo da ponte, ou por sessões de terapia. Da missão impossível à qual muitos se impõe, ao "Você devia ser igual seu irmão!", seu primo, seu tio... o pardal da praça.


O caso é que só podemos ser nós mesmos. E o preço a se pagar por "não ser" é, por vezes, muito alto.



* Augusto Carlos Duarte é psicólogo clínico, tendo como referencial a Psicanálise. Presta atendimento individual a crianças, jovens, adultos e idosos, bem como terapias de casal, ou em grupo. Possui graduação também em Comunicação Social (Jornalismo). É colunista da Rede Psicoterapias, onde escreve às sextas sobre Psicologia e Cultura. E-mail: augduarte2@gmail.com

 
 
 

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