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O todo e a parte

  • Foto do escritor: redepsicoterapias
    redepsicoterapias
  • 5 de set. de 2014
  • 4 min de leitura

Muito já se escreveu sobre o todo e a parte. Pouco se escreveu sobre o todo e a parte. Ora escreveu-se apenas parte, ora escreveu-se e pensou-se ter tido tudo.


Uma das maiores ciladas às quais nos deixamos apanhar é a famosa "Tudo Sobre...". Sempre sobra alguma coisa. "Tudo Sobre Fotografia", "Tudo Sobre Fórmula 1", "Tudo Sobre Cozinha Italiana", "Tudo Sobre Psicologia (ou Psicanálise)", "Tudo sobre The Beatles" etc.


E tão logo alguém, orgulhosamente, leva "tudo" para casa, descobre, num site qualquer "Dez coisas que você não sabia sobre The Beatles", ou Ayrton Senna, ou Freud e Lacan, e confirma não saber mesmo.


"Ops! Mas eu acabei de comprar o livro com tudo sobre! Obviamente, as dez 'coisas' estão aqui!"


Devora a obra e fica com aquela indigesta certeza de que não estão.


Culturalmente, temos nossas crenças "todo" e nossas crenças "parte".


O que seria uma crença "todo" e como isso se manifestaria através de um símbolo?


Por exemplo: o cristão que tem na Cruz, ou no Agnus Dei, algo que o identifica e o religa (religare, origem da palavra religião) com Deus.


Boa parte dos cristãos usam uma Cruz, ou um Agnus Dei, ou fazem simplesmente (não há nada de simples nisso) persignam-se com o Sinal da Cruz, como gestos ou comportamentos comuns.


São apedrejados, eu sei. Pois nossa sociedade acha perfeitamente normal usar-se camisas de times de futebol, tatuar o Ronaldinho Gaúcho no braço e unir-se em torno de um clube, mas acha "superstição", "crendice", até mesmo "ignorância", unir-se em torno de uma fé.


Mas, peguemos as questões da religião e da fé para analisar a parte: suponhamos que, em vez de uma cruz, seja ela de qual material for, ou de uma camisa de time, seja ele qual for, o cristão ou o torcedor encontre algo "parte", individual, para viver a experiência religiosa ou esportiva.


Algo como a "moedinha n° 1 do Tio Patinhas", que faz com que todo o império financeiro do pato mais rico do mundo não valha nada, caso os Irmãos Metralha, ou a Maga Patalójika (até ela foi diagnosticada como obsessiva e histérica, assim como os Irmãos Metralha certamente têm um conflito com a figura de autoridade e o pai dos "garotos" - aquele que faz a "castração" -, ao contrário do vovô e da mamãe Metralha não é muito presente) ameacem pegar o talismã.


No caso do cristão (evito chamar de fiel, pois fiéis existem nas mais variadas denominações), imagine, por exemplo, que ele se encaminha ao seu templo, angustiado pelo momento financeiro adverso que atravessa. Para lá se dirige, para pedir a Deus uma solução para o problema.


Tão logo pisa no adro, ou no primeiro degrau da escada, tal qual Tio Patinhas, encontra uma moedinha e vê nela um sinal divino de que o dinheiro está a caminho. Pior: esquece-se do "religare" e toda vez que deseja uma manifestação divina para suas presentes e futuras angústias, em vez de orar, confere se traz consigo a moedinha.


Quando não devidamente trabalhado, isso pode ser mais patológico do que Patalójika, mas, de alguma forma, magia e não fé.


No caso do torcedor, por exemplo, suponha que ele não se preocupe em ir a campo com um modelo determinado (já seria algo a se analisar) da camisa de seu clube preferido (os clubes normalmente têm os uniformes A, B e C), mas coloque na cabeça que todas as vezes em que compareceu ao estádio (ou mesmo assistiu pela TV; coitada da esposa!) com uma determinada cueca, o time ganhou. Se a esposa resolve lavar aquela cueca ensebada, no dia do jogo, o cara entra em parafuso (literalmente, pois por vezes começa a girar desesperadamente) porque, "agora", o time vai perder.


Parece ficção? Parece coisa de gente menos esclarecida, com menos acesso ao estudo e qualidade inferior de vida?


Bom, os aficionados por Fórmula 1 devem lembrar-se do acidente com o piloto Felipe Massa, quando uma peça soltou-se do carro do também brasileiro Rubens Barrichello e atingiu Massa na cabeça, causando um estrago no capacete e atingindo a testa do piloto.


Levado ao hospital, tendo passado por uma cirurgia delicada, o mundo desesperado e Felipe lamentou que sua cueca tinha sido cortada, no hospital. Não me pergunte a relação entre um ferimento da cabeça e a região pélvica, pois Medicina não é meu forte, mas eis o link sobre o "amuleto":


(http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Formula_1/0,,MUL838838-15011,00-SE+FOR+CAMPEAO+FELIPE+MASSA+PODE+APOSENTAR+A+CUECA+DA+SORTE.html)


Vale a pena, se o link não abrir imediatamente, copiar, colar e ler, pois é um achado em termos de "ó, meu Deus!"


Em um consultório de psicologia, é muito comum (e nada raro) depararmo-nos com pessoas que creditam a fatores externos (o fim do casamento em decorrência de um bolo ofertado à família por uma vizinha que acabou de se mudar; uma doença em decorrência do elogio de alguém sobre a saúde de ferro que a agora adoentada possuía etc.) aquilo que a elas atormenta. Sem perceberem que precisam trabalhar certas crenças, medos, padrões, como se houvesse uma "roca" na qual se espetasse o dedo e caísse no sono, como em "A Bela Adormecida". E passa-se toda a vida a fugir e a esconder todas as rocas do reino. Entre as quais aquela cuja utilização é muito salutar e essencial para se tecer a vida.


O cruel é que já temos "crenças" (eu as difiro das que não coloco entre aspas) sociais demais, para ainda procurarmos outras tantas, pessoais, angustiantes e por vezes transferíveis, com as quais nos fragilizar e torturar emocional e psicologicamente. E, ainda por cima, cuidando, zelando e lustrando tais "talismãs", como se não só dependêssemos deles, mas eles fossem as nossas vidas. Um consultório de psicologia é o lugar para se fazer uma boa avaliação e uma boa faxina (em termos do que deve ser descartado) e que até então tem-se colocado como a essência da nossa felicidade e que, mais do que amuletos, são amolações. Bem amoladas, bem afiadas, a nos rasgar a alma.


Mas fiquemos por aqui. Hora de eu tirar a cueca verde e a mesma camisa do América de sempre, que eu uso ao escrever os artigos as colunas para a Rede Psicoterapias, sem as quais as colunas não poderiam ser escritas. Hehehehehe.





* Augusto Carlos Duarte é psicólogo clínico, tendo como referencial a Psicanálise. Presta atendimento individual a crianças, jovens, adultos e idosos, bem como terapias de casal, ou em grupo. Possui graduação também em Comunicação Social (Jornalismo). É colunista da Rede Psicoterapias, onde escreve às sextas sobre Psicologia e Cultura. E-mail: augduarte2@gmail.com


 
 
 

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