Assembleias de classe e educação política
- redepsicoterapias
- 22 de out. de 2014
- 3 min de leitura
Estamos num momento efervescente político. Opiniões e notícias circulam por todos os lados, e cabe a cada um de nós filtrar conforme seu posicionamento o que mais lhe cabe. Escuto bastante a fala: odeio política ou política não se discute. De onde vem esse nosso pensamento? O que entendemos sobre política? Somos estimulados a questionar, dialogar e pensar democraticamente?
Em 2013 participei de um projeto que será apresentado no congresso Ciência e Profissão agora em novembro, que consistia em levar Assembleias de Classe a uma escola estadual da rede pública da grande São Paulo. As assembleias já são uma prática prevista pelo Ministério da Educação, e têm como objetivo principal inserir um contexto de diálogo no ambiente escolar, e a partir daí, ensinar a criança a se expor e solucionar conflitos de seu cotidiano através do diálogo.
Esse diálogo é feito de modo horizontal e geralmente é mediado pelos próprios alunos que se revezam na função. Em nosso caso, como estávamos iniciando o projeto, assumíamos esse papel. Nessa conversa, é possível compreender sentimentos, comportamentos e as relações interpessoais que estão presentes na sala através das situações expostas em saquinhos como “eu critico” e “eu felicito”. Além disso, elas ensinam práticas de expressão, articulação de ideias, argumentação, respeito à fala do outro e fundamentação de propostas em conjunto.
Tivemos muitos desafios ao longo do semestre em que estivemos na escola. Não foi fácil conversar com as crianças num primeiro momento, era um contexto muito marcado pela violência, particularmente. Fomos desacreditadas por eles, pela equipe da escola e por nós mesmas. Aos poucos, nossa presença constante somada à insistência presente nos ouvidos do psicólogo, eles foram confiando que não íamos reproduzir modelos de autoritarismo, mas sim um jeito novo de escutar e discutir os problemas que expunham a nós. Nossos pequenos ganhos, como conseguir organizar a fala em vez de “atropelar” o outro, eram comemorados com eles, e as crianças percebiam suas potências, se vendo como protagonistas de algo que surgia ali no coletivo.
Apesar disso, eles não acreditavam que sua fala poderia mudar algo na escola, mas percebíamos que ainda assim sentiam-se aliviados somente em falar e ter alguém que os escutasse. Ao longo das semanas, porém, foram compreendendo que com alguma organização, eram capazes de discutir com as lideranças, e isso foi um fator transformador: os pequenos se tornaram mais organizados e maduros, e apareceram questões diversas que mostravam a insatisfação deles e propostas para transformar o contexto escolar.
Isso fez pensar que o pensamento democrático não é inato, mas sim que precisa ser estimulado. Muito do que ouvíamos eram falas naturalizadas, reproduzidas sem questionar. Nosso papel era o de perguntar o porquê de muitas coisas, de fazê-los de responsabilizar por atitudes que tomavam e que muitas vezes enxergavam apenas no outro. O que é o pensamento político se não esse, de se responsabilizar pela parte que lhe cabe da sociedade? Crianças que hoje têm espaço para expor suas questões e são incentivadas a propor mudanças e resolver seus conflitos através do diálogo têm maior chance de serem adultos abertos ao pensamento livre e com capacidade de pensar de forma crítica e com menos violência. Até a próxima!
*Sabrina Lima é estudante de psicologia pela PUC-SP, é colunista da Rede Psicoterapias, onde escreve às quartas-feiras sobre cotidiano e contextos de crise em clínica ampliada. Além da Psicologia, é amante de música e das palavras, e atualmente se dedica ao estudo da escrita e suas formas de expressão como recurso terapêutico.
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