Povoesia
- redepsicoterapias
- 20 de fev. de 2015
- 2 min de leitura
O sinal vai mudar de cor
E toda a gente seguirá cantando
No asfalto pintado de estrelas.
Passos sem pressa
Seguirão sonhos de liberdade
Em caminho azul dançado de amor.
Cidade-festa
Povoesia
É hoje
O dia da eterna alegria.
Eu amo o carnaval. Esse sentimento não seria por mim revelado se não soubesse que nos une o desejo de estar juntos, partilhando a rua em sua mais bonita festa. Hoje formas sensíveis de ocupar florescem a avenida ainda recipiente de injustiça. Hoje a urbanidade brinca, hoje temos a certeza de que não sonhamos com a cidade feliz, mas a vivemos.*
Papeis picados transformam a cidade-concreto em cenário de poesia. Deixamos de enfrentá-la em sua pressa, em seu perigo, em sua indelicadeza. Agora BH dança comigo, posso vesti-la com flores de fino papel, posso reaprender a imaginar seus possíveis. Misturo meu corpo à rua e partilhamos a certeza de que somos a mais sagrada celebração da alegria.
Carnaval é muito. Muito gesto, muita cor, muita música. Libertação, entrega, turbulento desejo de ser tudo aquilo que guardamos, de afrouxar as amarras que criamos ou que criaram para nós. Hoje a gente é, e é tão bonito ser.
Carnaval afeta. Do abraço recebido de um desconhecido fica a tinta que faz o menino brilhar por dentro. O velho sério da janela guarda o sorriso desenhado na avenida. O mesmo sorriso contagia a mãe, que agora sai a distribuir as gotas da chuva que fez nascer de sua velha mangueira. Foi ela quem regou os sonhos que sua menina-princesa agora espreita com a ponta dos pés descalços: a chuva fez crescer, em chão seco e batido, centenas de flores bailarinas que povoavam a menina e agora saem a pular e dançar na rua que já leva nome de rosa.
Carnaval me lembra. A cidade quer realizar o seu desejo de ser plena enquanto festa. Mas ainda são muitos os cordões que nos isolam. De descobrir afetos desnorteadores, aqueles que vem do profundo encontro com o outro e deixam emergir o surpreendente em nós. Temos medo, preconceito, as cordas nos machucaram por dentro. As fantasio soltas como serpentinas, vejo os blocos se misturando, até se fundirem em um grande cortejo, com lugar para todos os ritmos. O carnaval se eterniza.
Mas era fantasia. Uma chuva fina molha a cidade e em gotas alcança o meu rosto, anunciando o fim do carnaval e contando que as fantasias agora viajam para um lugar distante, um fundo esquecido de armário, uma gaveta escura onde se tornarão cinza.
Vou conviver com a saudade, vou me acostumar ao som descompassado dos carros no meio da rua que há alguns dias foi povoesia. Novamente aprender a amar a cidade e refazer seu carnaval, não deixar morrer o desejo feito em festa de que ela seguisse sendo estrelas.

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