50 Tons de Psicologia

Olá, queridos leitores, estaremos juntos de novo em 2015! Para começar o ano bem, irei expor um pouco do que a psicologia diz sobre aquela sua amiga que adora a obra literária "50 Tons de Cinza". Antes que as fãs de Christian Grey comecem a se manifestar, já adianto que não vim atacar (ou defender) ninguém, nem tampouco divagar sobre as ações praticadas na famosa história. Não, não mesmo. Apenas usarei a história para exemplificar o assunto que quero tratar hoje: os estímulos supernormais.

Estímulos supernormais são incitações que se apresentam para nossa percepção como exageradamente melhores do que as reais ou naturais. Qualquer coisa que esteja ligada à sobrevivência e seja mais perfeita do que os seus ancestrais jamais conseguiram sonhar, irá, fatalmente, superestimulá-lo. O conceito surgiu a partir de trabalhos dos etólogos Konrad Lorenz e Niko Tinbergen, os quais mostraram que animais frequentemente se deixam enganar por sinais manipulados para parecerem mais exagerados. Uma espécie de besouro australiano, por exemplo, faz sexo com garrafas de cerveja. O que acontece é que, depois de anos de evolução, este besouro está predisposto a valorizar certos aspectos da fêmea. Eles preferem as grandes, marrons e brilhantes. As garrafas de cerveja são maiores, mais escuras e mais brilhantes do que qualquer fêmea real jamais será. Isso faz com que, na Austrália, seja comum você ver uma garrafa de cerveja no lixo coberta de besouros tentando entrar. Eles tentarão acasalar com as garrafas mesmo que isso seja sinônimo de ser devorado por formigas.

Nós, reles humanos, não escapamos desses estímulos hiperbólicos. Um exemplo simples é a nossa atual alimentação e o aumento cada vez mais frequente nos índices de obesidade e doenças cardíacas. No paleolítico era uma boa ideia ingerir bastante gordura e carboidrato. Hoje você não consegue resistir àquele cheese bacon com batata frita. A parte mais primitiva do nosso cérebro entende o cheese bacon com batata frita como um estímulo supernormal, melhor do que qualquer animal que você possa caçar ou afins. Infelizmente a informação de que hoje os tempos são outros e você não precisa mais disso fica soterrada em outro ponto do mesmo cérebro.

Tá, mas o que "50 Tons de Cinza" tem a ver com tudo isso? Bem, Christian Grey é um estímulo supernormal. Assim como o besouro australiano, nós humanos estamos predispostos a valorizar certos aspectos na hora de selecionar um possível parceiro. Há uma divisão de gênero milenar nesse caso: um carrega a descendência, se reproduzindo com menor frequência; o outro pode se reproduzir muitas vezes, sem maiores riscos. Assim, os machos da espécie humana tendem a valorizar aspectos de fertilidade e saúde nas fêmeas, enquanto estas valorizam os recursos e status dos reprodutores.

O psicólogo David Buss dedicou boa parte de sua carreira a estudar como funcionam estas escolhas e, em seu livro "The Evolution of Desire", ele desvenda alguns pontos chaves. O homem irá reparar na proporção entre quadril e cintura. Para os homens da maior parte do mundo, uma fêmea que apresente cintura com cerca de 70% da largura dos quadris é considerada atraente, independentemente dos padrões de beleza. De acordo com o psicólogo, uma proporção entre 67% e 80% indicaria saúde e boa aptidão para reprodução. Num estudo posterior, realizado pela psicóloga Kerri Johnson, confirmou-se que os homens realmente sentiam atração por mulheres com razão entre cintura e quadril de 70%. O curioso é que, neste mesmo estudo, descobriram que eles eram ainda mais atraídos por mulheres com cintura 60% e até 50%! Uma cintura de tamanho tão diminuto tornaria impossível para uma mulher a possibilidade de ter filhos, mas o cérebro do homem ignora a lógica para ficar apenas com a informação simples de que quadril largo e cintura pequena é algo bom.

Para as mulheres, um estímulo supernormal precisa de mais do que proporções entre partes do corpo. Como têm mais questões em jogo na hora de escolher seu parceiro, as mulheres desenvolveram uma lista complexa e particular que engloba, sem se limitar, é claro, a características como: capacidade econômica, ambição, status social, estabilidade, inteligência e altura. Qualquer um desses adjetivos pode se tornar um estímulo supernormal, mas, para que um homem fosse um estimulador desse gabarito, ele teria que possuir vários desses requisitos. Um engenheiro alto, com carrão, bem sucedido e rico, é muito mais atrativo do que um taxista de estatura mediana, não importa o quão bem esculpido seja o seu corpo. Pois é, nem precisa ser tão bonito quanto o Sr. Grey!

Voltando aos "50 Tons", o slogan da adaptação cinematográfica diz "Perca o controle". Bem, agora você sabe que besouros australianos perdem o controle e morrem tentando copular com garrafas de cerveja por não conseguirem superar seus desejos. Com seres humanos não é muito diferente. Cuidado ao se deparar com algo que lhe pareça muito mais incrível e perfeito do que o normal, pois pode ser apenas um gatilho ancestral do seu cérebro. Supere os besouros, não perca o controle.

Até a próxima.

#luizmedeiros