Bom mesmo é viver!
- Heder Naves Batista
- 27 de mar. de 2015
- 4 min de leitura

“Num mundo que se faz deserto, temos sede de encontrar um amigo.” (Antoine de Saint-Exupéry).
Penso que todos nós temos um livro que tomamos como referência para nossas reflexões, aquele que lemos uma, duas, três, dez vezes e dele sempre tiramos uma lição nova ou simplesmente o elegemos como uma boa leitura a ser feita em diferentes ocasiões.
O livro que escolho sempre como leitura é o clássico “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de Sant-Exupéry. Tive contato com esse livro quando tinha aproximadamente 17 anos e, desde então, ele se tornou um companheiro nos mais variados momentos que tenho vivido, sejam eles tristes, de preocupação, de dúvidas ou em momentos de alegria e entusiasmo. Só para constar para aqueles que ainda não o leram, esse livro não é de autoajuda, mas inspira e renova meus sentimentos e vontades.
Escolhi falar um pouco sobre minha predileção por esse livro para usar uma frase que faz parte de sua narrativa: “Num mundo que se faz deserto, temos sede de encontrar um amigo”. Apresentando essa frase, adentro na reflexão dessa coluna e já com um questionamento para refletirmos: o que é ser/ter um amigo?
Pergunta um tanto fácil de responder, dirão alguns; outros necessitarão de um tempo maior para pensar; em vista que alguns poderão com rapidez responder: não tenho amigos.
Gaste o tempo que for necessário para refletir sobre essa pergunta, recorra a todos os seus momentos vividos e às suas experiências sociais, pense nos que estão a sua volta e fazem parte de sua vida. Pense também naqueles que estão longe, mas que de alguma forma marcaram um pouco sua existência. Ah, mas principalmente, recorra a entender e responder se você é um bom amigo e só continue a leitura desse texto depois que obtiver a resposta para sua reflexão, e não espere que tendo a resposta eu vá tentar mudar sua opinião e, menos ainda, que irei dar a resposta se não conseguiu encontrar a sua.
Minha proposta é fazer com que retomemos nossas relações humanas, aquelas relações de existência onde nos permitíamos ser e fazer parte da vida das pessoas e elas das nossas. Mas como assim? Vivemos num mundo globalizado, fatos e eventos “ao vivo”, redes sociais que nos aproximam das pessoas e das informações, facilidade de saber o que acontece do outro lado do mundo e com a rapidez que só a modernização pode nos trazer. Não nos relacionamos?
Pode parecer estranho, mas o fato é que mesmo com tanta facilidade de comunicação acabamos por nos distanciar das pessoas, das relações humanas, dos amigos e, porque não, de nós mesmos. Esquecemos de como era bom poder ir a casa do amigo do outro lado da rua para, simplesmente, conversar e matar o tempo. Ou não temos mais o hábito de ir à casa da avó e tomar um belo café da tarde. E ainda, não nos reunimos mais aos domingos para o almoço com a família. Ah, claro, para que perder o tempo no trânsito para chegar à casa de alguém – tempo esse precioso, se eu posso pegar o celular e mandar uma mensagem e manter um contato? Poupei meu tempo para meus outros afazeres que são mais importantes – pensarão alguns.
Não sou uma pessoa nostálgica, que vive no passado ou que é avesso às tecnologias. Muito pelo contrário, como a grande maioria, faço valer todo o arsenal tecnológico que me é apresentado e com o qual tenho contato. Mas tenho saudades do tempo em que a busca pela amizade se constituía nas relações humanas reais e não pautadas nos mecanismos tecnológicos.
Muitas discussões já se fizeram presentes sobre esse tema da falta das relações humanas no mundo globalizado, dos interesses das pessoas em querer manter ou não um contato real com outras, da dificuldade e do medo de confiar nas pessoas pela onda de violência que vivemos e tantos outros argumentos já foram levantados sobre a condição atual.
Meu intuito se pauta na pergunta que fiz a pouco tempo (e espero que você tenha refletido), sobre ter e/ou ser um amigo. No livro O Pequeno Príncipe, percebemos muito bem a busca incessante do principezinho atrás do sentido da amizade, daquele sentimento que move as pessoas em direção a encontrar um bem precioso, de compartilhar momentos e sentimentos da vida, de ter e manter as relações humanas.
Penso que realmente vivemos num deserto onde já quase não temos mais tempo para o outro – e o pior, já não temos mais tempo para nós mesmos. Acredito que encontrar um amigo no meio desse deserto todo é mais do que simplesmente ter alguém para ser confidente ou para trocar ideias, mais do que rir ou chorar com esse alguém. Vejo que a necessidade maior do homem é se encontrar no outro, ou seja, perceber que para encontrar um amigo é necessário que eu me encontre primeiro no meu deserto, na minha falta de tempo, nas barreiras que eu próprio coloco para me relacionar comigo mesmo.
Há alguns dias vi em uma rede social um grupo de pessoas que escreviam algo em um papel, tiravam fotos e postavam com dizeres parecidos como “a letra das pessoas”, onde a proposta era conhecer a letra por detrás dos teclados. A ideia é válida, de certa forma, tenta diminuir a distância, a formalidade e a conhecer as pessoas. Mas penso que seja pouco e vou mais longe.
Se você chegou até aqui lendo esse texto, aceitando ou não o que coloquei como reflexão, lanço um desafio: abandone o teclado do computador ou do celular, deixe de lado as câmeras de fotografia e as redes sociais, esqueça a dificuldade do trânsito e as desculpas: vá! Isso mesmo vá! Para onde? Vá para onde seu coração e sua necessidade mandarem. Vá para casa dos seus pais, dos seus avós, vá se encontrar com seus amigos. Pegue seu filho e vá passear, tomar um sorvete, dar uma volta. Tome sua esposa, esposo, namorado, companheiro, cachorro, mas vá! Não tem para onde ir, com que ir? Vá sozinho. Vá se encontrar primeiro com você mesmo. Vá viver a vida, viver as relações humanas. Vá matar a sede de encontrar um amigo, de sair desse deserto. Vá!
(Ah, e depois se possível, me conte sua experiência de ida, de buscar vivenciar suas relações humanas, mesmo que seja por um e-mail, rsrs).
Heder Naves Batista
hedernaves@uol.com.br

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