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Quando adoecemos por não trabalhar

  • Rodrigo Padrini
  • 17 de abr. de 2015
  • 3 min de leitura

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“Em quatro anos, à medida que meus rendimentos foram sendo liquidados, meu estado de espírito passou da incredulidade à insegurança, depois à culpabilidade e, por fim, à sensação de injustiça. Hoje, eu me sinto é raivoso” Recursos Desumanos – Pierre Lemaitre

É como Pierre Lemaitre descreve o sentimento momentâneo de seu protagonista em seu romance, um executivo desempregado de 57 anos. Você está desempregado? Ou conhece alguém que esteja? Pergunte-lhe como se sente todos os dias quando acorda pela manhã e não possui nenhum horário ou obrigação a cumprir. Você não está atrasado. Não precisa comparecer a tal reunião e nem está com um prazo esgotando para entregar aquele projeto. Não há colegas de trabalho lhe esperando para dar aquele ‘bom dia’ rotineiro e, o pior, e mais óbvio, não haverá salário caindo em sua conta no início do mês. O desemprego é tratado geralmente como um fantasma ou um monstro que nos assombra, alimentando uma péssima reputação social. Em Psicologia do Trabalho é comum encontrarmos diversas referências teóricas quanto ao adoecimento no trabalho e aos inúmeros fatores que permeiam nossa relação com a atividade e o ambiente profissionais. Entretanto, e quando não há trabalho? E quando estamos lidando com ‘o mundo sem trabalho’? Ao participar de um seminário no Brasil em 2007, Yves Clot (2010) comenta brevemente sobre o que chama de psicopatologia do desemprego. Após afirmar que, atualmente na França, o desemprego deixou de ser transitório e tornou-se uma condição social e durável, Clot (2010) fala sobre uma psicopatologia do trabalho do homem supérfluo, ou seja, dos que perderam o sentimento de sua utilidade no mundo. O autor ressalta que, em uma pesquisa realizada com uma associação de desempregados, foi possível perceber que não só a falta do salário ou de recursos materiais tornavam aqueles indivíduos doentes, mas também a impossibilidade de contribuir com a história social, estando fora da obra comum. O sentimento de inutilidade traz assim um elemento chave para pensarmos o adoecimento no mundo sem trabalho. Não fazer nada é extremamente cansativo. Clot (2010) observa que a fadiga e o desgaste, mental e físico, podem ser intensos em indivíduos sem trabalho, afinal, passam grande parte do tempo ruminando – como diz o autor – sobre as coisas que já fizeram e que não fazem mais. Assim como muitos teóricos, defendo a centralidade do trabalho na vida dos indivíduos, vendo-o como aspecto elementar para compreender nossa subjetividade. O trabalho é um meio de produzirmos a vida, criarmos sentidos e nos incluirmos socialmente. Desse modo, é coerente a análise feita por Pinheiro e Monteiro (2007) quando afirmam que o desemprego traz um importante e preocupante processo de desvalorização social. Além da pressão vivida pela ameaça da perda do emprego e a tão temida perda material iminente, o desemprego traz consigo uma grande carga subjetiva. A ausência das principais referências do cotidiano e a angústia de ocupar um papel tão negativo socialmente, podem levar o indivíduo, como afirmam Pinheiro e Monteiro (2007), a encontrar na doença uma espécie de refúgio. Ou seja, é menos constrangedor socialmente estar doente do que estar desempregado. Curioso, não? A ideia de estar sendo expulso do mundo trabalho e excluído da sociedade podem estar presentes no imaginário do desemprego e suas consequências vão muito além do próprio indivíduo afetado, invadindo seu contexto familiar, produzindo reações psicológicas e físicas. Culpa. Insegurança. Raiva. Ansiedade. Fracasso. Inutilidade. Se culpar por estar desempregado e se sentir responsável por estar desqualificado para um mercado cada vez mais exigente e incompreensível, é uma tendência perigosa para quem vive a falta de trabalho. Com base em diversas pesquisas, Pinheiro e Monteiro (2007) afirmam que o desemprego, em relação ao adoecimento mental, produz desde o simples prejuízo da autoestima até casos relacionados com o suicídio. Devemos ter uma compreensão ampla desse estado e não cairmos no erro de simplesmente assumirmos o papel social de exclusão e condenação do sujeito desempregado. O problema é sempre muito mais complexo e nossa tendência de culpabilizar o indivíduo em detrimento do funcionamento de um mercado de trabalho muitas vezes cruel, deve ser observada com cautela. Assim como Clot (2010), para mim, a atividade que não pode ser feita, a impossibilidade de contribuir com a obra comum e, como citam Pinheiro e Monteiro (2007), a desvalorização social, são aspectos fundamentais para quem busca compreender o adoecimento no mundo dos ‘sem-trabalho’.

Referências: CLOT, Yves. A Psicologia do Trabalho na França e a perspectiva da Clínica da Atividade in Fractal: Revista de Psicologia, v. 22 – n. 1, p. 207-234, Jan/Abr. 2010 PINHEIRO, Letícia R.S.; MONTEIRO, Janine K. Refletindo sobre desemprego e agravos à saúde mental in Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, vol. 10, n. 2, pp. 35-45. 2007


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